quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Literatura Infantil: Sobre o poema Bolha


(1) Olha a bolha d’água
(2) No galho!
(3) Olha o orvalho!

(4) Olha a bolha de vinho
(5) Na rolha!
(6) Olha a bolha!

(7) Olha a bolha na mão
(8) Que trabalha!

(9) Olha a bolha de sabão
(10) Na ponta da palha:
(11) Brilha, espelha
(12) e se espalha.
(13) Olha a bolha!

(14) Olha a bolha
(15) Que molha
(16) A mão do menino:

(17) A bolha da chuva da calha!

(Cecília Meireles)

I – Aspectos estruturais e semânticos

Para Nelly Novaes Coelho, há quatro aspectos que integram o processo poético: os elementos estruturais da linguagem poética, os processos intensificadores, os processos imagísticos e a natureza das classes de palavras (1976, p.61).
O poema em questão apresenta seis estrofes livres e 17 versos heterométricos. Não há um esquema homogêneo quanto à disposição das rimas, ora ela é intercalada, ora emparelhada, ou seja, trata-se de rimas misturadas, apesar da reiteração de palavras com rimas semelhantes como palha, espalha; galho, orvalho; calha, molha.  Quanto à pontuação, observa-se o uso abundante da exclamação (signos emotivos) e o ponto e os dois pontos (signos lógicos).
De acordo com Coelho, “o significado poético latente em um poema pode ser realçado ou intensificado de vários modos”, (1976, p.87). Um exemplo de reiteração é o substantivo “bolha” (aparece nove vezes), o verbo “Olha” (oito vezes).  Obviamente, essa reiteração influencia na musicalidade do poema. A expressão “Olha a bolha” (sete vezes) é um exemplo de anáfora. Também vale destacar, que na primeira estrofe, destaca-se a aliteração dos fonemas /b/ /d/ (bolha d’água), que remete a sons de estouro.
Dentro dos processos imagísticos temos uma metáfora em relação ao significado de bolha (bolha de sabão e bolha de calo). No primeiro caso, a bolha remete a leveza de uma brincadeira de criança; no segundo, a árdua consequência de um trabalho duro. Outro o recurso é a sinestesia, o sujeito lírico enxerga, toca e degusta as diversas bolhas presentes no decorrer do poema.
Por fim, destaco a força do verbo “olhar” no referido poema, a opção pelo modo imperativo fez toda a diferença, pois o eu lírico impõe esse olhar de tal forma que o leitor não consegue desviar.




II – O leitor

Primeiramente, vale salientar que  a escolha de um possível leitor não significa que o referido poema não esteja acessível a outras faixas etárias. Para esse trabalho, sugiro o poema de Cecília Meireles para faixa etária entre 12 e 14 anos, por ser uma idade correspondente às séries finais do Ensino Fundamental, que inclui  o público alvo do Curso de Letras: Língua Portuguesa e Literatura.
De acordo com Maria da Glória Bordini, em seu artigo - Poesia infantil e transitoriedade do leitor criança - há certos critérios para atender essa transitoriedade. Para o caso em baila, Bordini sugere tanto gêneros formais como os sonetos, como também poemas de formas livres e líricas reflexivas (2009, p.31). Nesse sentido, as formas livres do poema Bolha  e a possível reflexão sobre a questão da efemeridade (bolhas de sabão na infância x bolhas de calo na fase adulta), justificam essa escolha. Para esse comparativo é necessário, segundo a autora, características textuais como riqueza imagética, habilidades como percepção estética dos processos linguísticos artísticos (200, p.32). Nesse sentido, o poema escolhido corresponde às expectativas.
No  entanto, vale destacar, que “o texto não é pretexto para nada”, (1985, Lajolo). Isso significa que o professor tem que se a ter a sua especificidade (análise poética) e relacionar os aspectos estruturais, semânticos e lexicais de forma unitária para não interferir no lirismo de sua concepção.

Referencias Bibliográficas

BORDINI, Maria da Glória. Poesia infantil e transitoriedade do leitor criança. São Paulo: Revista Via Atlântica, 2008. p. 23-33.

COELHO, Nelly Novaes. Literatura & Linguagem: a obra literária e a expressão linguística. São Paulo: Quíron, 1976.

LAJOLO, Marisa. O texto não é pretexto. In: ZILBERMAN, Regina. Leitura em crise na escola: as alternativas do professor. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1985. p. 52-62.


MEIRELES, Cecília. Ou Isto ou Aquilo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1991.

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