quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

SURDEZ, MUDEZ e LIBRAS

Opinião - De forma simplória, encontramos algumas definições de surdez e mudez em uma busca rápida na internet, como na Wikipédia Brasil, que define surdez como “prejuízo auditivo ou perda auditiva, uma inabilidade total ou parcial de ouvir”. Já a mudez ou afonia é tida como “uma deficiência que indica incapacidade (total ou parcial) de produzir a fala”. Como percebemos, mudez e surdez não significam a mesma coisa, apesar do arcaico termo “surdo-mudo” ser ainda usado em nossa sociedade, isso porque muitos associavam e associam a mudez ao surdo. Sobre a surdez, Strobel traz uma perspectiva interessante ao abordar a concepção clínico-patológica e a sócio antropológica:
A concepção clínico-patológica concebe a surdez como uma deficiência a ser curada através de recursos como: treinamento de fala e audição, adaptação precoce de aparelhos de amplificação sonora individuais, intervenções cirúrgicas como o Implante Coclear etc. Nesse sentido, o encaminhamento é o trabalho fonoaudiológico e a escola comum, com o objetivo de “integrar” a pessoa surda no mundo dos ouvintes através da “normatização” da fala. E a concepção sócio-antropológica concebe a surdez como uma diferença a ser respeitada e não uma deficiência a ser eliminada. O respeito à surdez significa considerar a pessoa surda como pertencente a uma comunidade minoritária com direito à língua e cultura própria. (2008, p. 36).

A concepção sócio antropológica a meu ver é a mais apropriada, pois a pessoa surda tem todo o direito de encontrar o seu espaço ... de se encontrar, e nesse sentido, a Língua de Sinais pode fazer toda a diferença, como observamos no livro “Tibi e Joca – uma história de dois mundos”. Nessa obra ilustrativa, o leitor é conduzido delicadamente ao contexto de menino surdo nato. A narrativa apresenta pontos cruciais como a descoberta da surdez pelos pais, o drama do menino até a descoberta da Língua de Sinais e o desafio da família ouvinte em se adaptar a língua do filho. O clímax se dá pela superação das dificuldades através da dedicação e do amor que constrói metaforicamente uma ponte entre os dois mundos: o do filho surdo e o dos pais ouvintes. Também posso dizer que o próprio livro é uma ponte entre surdos e ouvintes, pois o mesmo foi produzido com tamanha delicadeza que atinge plenamente ambos os leitores. Mas, o que é a LIBRAS?
A língua dos sinais no Brasil é uma prática antiga, no entanto a sua nomenclatura oficial – LIBRAS[1], que significa Língua Brasileira de Sinais - é recente. Essa denominação foi estabelecida em outubro de 1993, por meio de uma Assembleia organizada pela Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (Feneis).
A Lei nº 10.436, que reconhece e oficializa a língua de sinais brasileira, também é nova, datada em de 24 de abril de 2002 e regulamentada pelo Decreto nº 5.626 de dezembro de 2005. No parágrafo único do primeiro artigo da Lei 10.436 temos uma breve explicação sobre o que se entende por LIBRAS:
“Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil” (BRASIL, 2002, Art.1º).

Estrategicamente, o referido parágrafo faz referências à “comunidade de pessoas surdas”, mas o que isso significa?
Comunidade surda é um grupo de pessoas que vivem num determinado local, partilham os objetivos comuns de seus membros, e que por diversos meios trabalham no sentido de alcançarem estes objetivos. Uma comunidade surda pode incluir pessoas que não são elas próprias Surdas, mas que apoiam ativamente os objetivos da comunidade e trabalham em conjunto com as pessoas Surdas para os alcançar (STROBEL, 2008, p. 30).

Dessa forma, percebemos que definir surdez vai muito além dos resumos de internets e verbetes de dicionários. O que precisamos é nos incluir nessa comunidade, ou seja, criar novas pontes e descontruir velhos paradigmas voltados exclusivamente para uma sociedade ouvinte.




Referências Bibliográficas

BARROS, Jozibel Pereira; HORA, Mariana Marques da. Pessoas Surdas: Direitos, Políticas Sociais e Serviço Social. Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 2009. Disponível em: http://www.editora-arara-azul.com.br/cadernoacademico/012_anexos_pessoas_surdas_direitos_politicas_sociais_e_servico_social_barros_hora.pdf. Acesso em 03 de junho de 2016.


BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 20012.  Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm. Acesso e 03 de junho de 2017.


STROBEL, Karin L. As imagens do outro sobre a Cultura Surda. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2008.




[1] Vale destacar, que a LIBRAS e outras línguas de sinais são de modalidade visual-espacial, enquanto que as línguas orais são de modalidade oral-auditiva. A LIBRAS é uma língua natural (1ª língua) usada pela comunidade surda brasileira.

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